Departamento de Genética - Universidade Federal do Rio de Janeiro
Curso de Genética de Microrganismos- Prof. Ana Coelho
Trancrição e trasdução. Polaridade.
A expressão gênica começa com a ligação da RNA polimerase ao promotor para iniciar a transcrição dos mais de 1000 operons e gens isolados de bactérias.
No DNA feixe duplo, em cada trecho, geralmente apenas um dos feixes contem a informação para um mRNA e a proteina codificada a partir dele, como mostra a figura abaixo:
A quantidade de produto de um gene (proteina) é em grande parte determinada pela frequência de iniciação de transcrição (meia vida curta do mRNA de procariotos), e esta varia de 4 ordens de grandeza in vivo.
Etapas do processo de iniciação:
- RNA pol+ promotor formando: Complexo de iniciação fechado
- Complexo de iniciação aberto
- +NTP formando complexos ternários
- Complexo ternário em elongação+ promotor livre
O promotor:
A sequência de uns 300 promotores de E. coli reconhecidos por sigma 70 (ver depois fator sigma) foram comparadas. Mostrou-se a importância de 2 hexâmeros centrados em -10 e -33, que são chamados de região -10 e -35 (TATAAT e TTGACA, respectivamente) separados por 17 nucleotídeos.
Na maioria dos promotores o nucleotídeo correspondente a +1 e o A.
Nos promotores mais fortes geralmente não tem mais que 3 nucleotídeos diferente do consenso.
Alem desta sequência dos promotores, algumas vezes existem sequências acima destas, denominadas sequencias UP ou abaixo, e que são importantes para aquele promotor.
RNA polimerase:
Uma única RNA polimerase é responsável, em bactérias, pela síntese de mRNAs, rRNAs e tRNAs, ao contrário do que ocorre em eucariotos.
RNA pol é uma das maiores proteinas bacterianas, com 400 kDa no caso de E. coli.
Formada por 2 subunidades alfa, uma beta, uma beta' e uma subunidade sigma, também chamada fator sigma. As 4 primeiras subunidades formam o que chamamos de polimerase central. A polimerase completa inclui o fator sigma. Este vai estar presente no momento da interação da RNA polimerase com o DNA mas vai se soltar depois, ficando só a polimerase central fazendo a elongação.
Subunidades alfa, beta e beta' sao produtos dos genes rpoA, rpoB e rpoC respectivamente. O fator sigma 70 e produto do gene rpoD.
RNA polimerase, como outras polimerases, tem uma estrutura de mão, com uma palma, onde vai ser feita a síntese, e uma região mais longa e flexível, provavelmente se enrolando em volta do DNA.
Papel das subunidades nas etapas de iniciação:
Fator sigma, de especificidade: precisa de um fator sigma para se ligar a um promotor.
E. coli sintetiza ao menos 6 fatores sigma, cada um conduzindo a RNA polimerase para promotores distintos.
O fator mais importante é o sigma 70, usado para a grande maioria das funções por E. coli em crescimento exponencial.
Outros fatores sigma: sigma 32 e sigma 24, envolvidos com resposta ao choque térmico.
Assimilação de nitrogenio: sigma 54
Expressão de flagelo: sigma 28
Expressão em fase estacionária: sigma 38.
Todos eles são homólogos, a menos do sigma 54. Comparando ainda com fatores sigma de outras bactérias, conclui-se que existem dois grupos de fatores sigma, o grupo do sigma 70 e do sigma 54.
O sigma 70 de E. coli é mais semelhante a outros fatores sigma 70 de outras bactérias do que a fatores alternativos tipo sigma 32 da própria E.coli.
Estudo mais completo do sigma 70, e suas regiões de contato com o promotor.
Divisão do sigma 70 em 4 regiões, sendo que uma região faz contato com a região -10 e outra com a região -35 do promotor. Também está definida uma região 2.1 de contato com a região central da RNA polimerase.
Sigma 70 também participa na abertura do complexo de iniciação.
O fator sigma também esta envolvido em alguns casos de regulação gênica por fatores que se ligam em torno da posição -40. Eles atuam se ligando à regiao 4 do sigma 70.
A subunidade alfa da RNA polimerase tem um papel importante na ligação a regiões acima do -35 e a fatores de transcrição.
A parte C terminal da subunidade alfa faz contato com regiões acima de -35. Assim alguns elementos UP interagem com ela.
Além disso muitas das proteinas regulatórias interagem com esta subunidade alfa.
Em promotores que nao tem sitios UP ou que não são regulados por proteinas, o terminal N da subunidade alfa (2/3 da subunidade) já é suficiente para formar a parte central da RNA polimerase e fazer transcrição.
As Subunidades beta, beta' e sigma fazem contato com regiões -10 e -35. As subunidade beta e beta' estão envolvidas na ligação do DNA e NTP, mas estão menos estudadas que a alfa.
Quais são os principais determinantes da iniciação de transcrição? O principal é a sequência do promotor, mas outros fatores importantes são a concentração de RNA polimerase e repressores e o grau de torção do DNA.
Detalhamento das etapas de transcrição:
Inicialmente ocorre uma ligação reversível da RNA polimerase completa ao DNA feixe duplo na região promotora. Este é o chamado complexo fechado. Esta ligação envolve contatos sobre uma face do DNA e entre as posições -55 e -5.
Estudos de complexos binários RNA pol+ DNA. Geralmente feitos através de footprint, experiências onde a proteina ligada protege o DNA de cortes.
Depois disso ocorre uma mudança conformacional, e a RNA polimerase passa a cobrir regiões também mais abaixo do sítio de início da transcrição, agora entre -55 e +20. A parte de -10 a +20 fica protegida nos dois feixes, e não só numa face do DNA. Assim, pensa- se que esta parte fica num túnel ou fenda da RNA polimerase.
Pelas dimensões da RNA polimerase e o tamanho da região de DNA protegida no segundo complexo fechado e no complexo aberto, concluem que deve ocorrer dobra no DNA para que uma região maior que o tamanho da polimerase possa ser protegida por ela.
Então ocorre a abertura de 10 a 15bp do DNA, desde -10 incluindo região +1.
Complexo ternário inicial:
Prefere iniciar com purina, geralmente A (C é o menos usado).
Liga-se o primeiro nucleotídeo. e mais alguns, numa etapa ainda reversível, onde pode ser abortada a transcrição.
Etapa vai até "liberação do promotor" quando contatos com o promotor se perdem e sigma se solta.
Após 2 nucleotídeos ligados à região aberta já muda um pouco para a frente.
Após a transcrição de 7-12 nucleotídeos a subunidade sigma é liberada e a elongação processiva continua, até ocorrer um término de transcrição.
Taxas de elongação: 50 a 100 nucleotídeos por segundo, relativamente lento, permitindo um bom acoplamento com a tradução.
Complexo deve se mover no minimo 30 a 60bp para permitir nova ligacao de RNA polimerase a promotor.
Regulação intrínsica da atividade do promotor: efeitos da sequência do promotor e estrutura.
Muitos estudos feitos com mutações na sequência do promotor, que muitas vezes levam à diminuição da força dos mesmos, mas às vezes a aumento.
É muito importante o conceito de contexto, ou seja, as sequências adjacentes ao local onde está imerso um determinado promotor. A mesma sequencia de promotor pode ter uma força variando de 10 vezes se colocada em outro "contexto".
Será que modificações da região -35 ou -10 afetam etapas diferentes da transcrição?
O modelo de duas partes inicialmente proposto dizia que a regiao -35 afetava a ligação inicial da polimerase com o promotor e a -10 a abertura do DNA.
Mas na verdade, mutantes na regiao -35 e -10 afetam varias etapas da iniciação.
Papel da sequência entre eles (17bp) orientar os hexâmeros -35 e -10.
Curvatura intrinsica em regioes de series AnTn. Outras dobras induzidas por ligacao com proteina.
Mudancas no sitio de inicio.
Efeito de sequencias acima e abaixo do inicio na forca do promotor, importantes para alguns promotores.
Em alguns casos os promotores tem regioes -10 estendidas, alguns deles sem regiao -35.
Elementos UP, alguns bem caracterizados, por ex, caso do rrnBP1, regiao de -40 a -60. Ocorre estabilizacao do complexo inicial fechado. RNA pol alfa se ligando a esta regiao.
Outros efeitos acima do inicio. Efeitos de curvatura do DNA, em geral ajudando transcricao.
Efeitos de variaveis extrinsicas na iniciacao.
Supertorcao do DNA. Torcao negativa ajuda a abrir o DNA. Vai abrir 1 a 1,5 voltas do DNA na formacao do complexo aberto.
Esperaria-se que sempre a torcao negativa favorecesse a transcricao, e , em alguns casos isto ocorre, mas nem sempre. Depende do promotor.
Acoplamento da transcrição e da tradução:
Em bactérias a transcrição e a tradução ocorrem simultaneamente. Assim que o RNA vem saindo da RNA polimerase ele já está disponível para a ligação por ribossomas.
Uma unidade transcricional típica contem alguns genes com um único promotor fazendo a sua regulação de transcrição, e dando origem a um transcrito único contendo a informação a ser traduzida para cada um dos genes.
Note que a RNA polimerase pode re-iniciar a transcrição a partir do promotor, assim, este mesmo transcrito poderá ser feito várias vezes durante o ciclo celular.
Cada um dos genes pode ser traduzido de forma independente, pela ligação de ribossomas às respectivas RBS (sequências de ligação ao ribossoma) (também chamadas sequências de Shine-Dalgarno) de cada gene.
Na tradução também, cada gene pode ser traduzido várias vezes, desde que ribossomas se acoplem várias vezes ao RNA para fazer esta tradução.
Os mRNAs bacterianos tem meia vida média curta, da ordem de minutos, e logo estes mRNAs começam a ser degradados a partir da extremidade 5'.
Terminação:
A terminação ocorre quando se desfaz o complexo ternário. Ela pode ocorrer espontaneamente, ou mediada por um fator bacteriano.
Uma forma de término depende da sequência mesmo do RNA formado, são os terminadores intrínsicos.
Já o outro tipo de término depende de uma proteina bacteriana denominada rho, ou fator rho. Várias outras espécies bacterianas tem equivalentes para o fator rho.
Terminadores intrínsicos (ou independentes de rho): Tem aproximadamente 20bp de sequência rica em GC, e com possibilidade de formar haste-alca (ou seja, em repetição invertida) no RNA. Após isto tem um trecho de aproximadamente 8 resíduos U no RNA.
Formação da região de haste-alca diminui e enfraquece a ligação do RNA formado ao molde. Além disso a parte final e um híbrido rU:dA, que é particularmente instável.
Terminação dependente de rho.
Estes terminadores contem duas partes, que no total se estendem por 150-200bp do DNA. Uma parte é a região onde a terminação ocorre, e a outra uma regiao acima desta, e denominada rut.
Os términos dependentes de rho tem sequência muito variada, em contraste com as estruturas bem características dos independentes de rho.
Características da região rut: região de ao menos 85nt, em feixe simples, e com alguns C na composição.
Aparentemente rho faz a RNA polimerase terminar a transcrição em sítios que seriam de pausa, logo abaixo da região rut. Rho atuando como um fator de liberação da RNA pol.
A proteina Rho é um hexâmero de um único polipeptídeo. Forma um anel achatado com as 6 subunidades.
A proteina consegue proteger 70 nucleotídeos de RNA, indicando que faz uma ligação extensa com o RNA.
O fator rho é uma ATPase dependente de RNA.
As interações entre Rho e o RNA, acopladas à hidrólise de ATP levam à dissociação do RNA do seu complexo com a RNA polimerase e o DNA. Isto leva à terminação da transcrição.
Polaridade:
Modificações na sequência de um operon podem fazer com que genes abaixo desta modificação não sejam expressos. Este fenômeno é denominado de polaridade.
Algumas vezes mutações sem sentido num gene inicial de um operon levam ao término da expressão de genes abaixo dele.
A princípio uma terminação de tradução de um gene não deveria interromper a transcrição ou a tradução de genes abaixo do mesmo.
O que acontece nestes casos é que após o término de tradução temos uma região de mRNA livre de ribossomas, que pode expor possíveis sítios de término de transcrição dependentes de rho.
Desta forma um evento a nível de tradução, acaba propiciando um término de transcrição, e o término da expressão dos genes abaixo dele, a nível de transcrição.
Artigo: DNA sequences required for translational frameshifting in production of the transposase encoded by IS1Sekine, Y & E Ohtsubo (1992) Mol. Gen. Genet. 235:325-332.
Este artigo descreve o fenômeno de mudança de quadro de leitura feito por um ribossoma, levando à síntese de uma nova proteina (ativa e importante), que não seria sintetizada no seu quadro de leitura usual.