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As esponjas

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No dia 20 de abril de 2011, partimos para o Arquipélago de São Pedro e São Paulo (ASPSP). A expedição, que durou 26 dias, ocorreu no âmbito dos projetos Conectividade entre populações de invertebrados marinhos de águas rasas do Arquipélago de São Pedro e São Paulo e da costa brasileira e Potencial invasor de espécies exóticas de esponjas marinhas nas ilhas oceânicas brasileiras. O primeiro com financiamento do CNPq e o segundo da Fundação Grupo Boticário. A equipe constava de um aluno de doutorado (eu, Emilio Lanna) e de um aluno de mestrado (Leandro Pessoa).

As preparações para a expedição começaram meses antes, com a realização de cursos de mergulho “Avançado”, “Resgate” e “Primeiros socorros”, exigências para se mergulhar no distante arquipélago. Após a preparação do material, foram feitas reuniões sobre as espécies que deveriam ser coletadas e como coletá-las. Ainda em Natal, integrantes da equipe da UFPE, Mariana e Polyana, completaram a equipe da expedição 328 do Programa ASPSP. Foram feitos os exames médicos finais e nos preparamos para encarar 4 dias de viagem dentro do barco Transmar I. Na quinta-feira da Paixão, dia 20 de abril, embarcamos no Transmar I, conhecemos os pescadores que nos acompanhariam nos próximos 20 dias e zarpamos em direção aos “rochedos”. O primeiro dia de viagem foi bem tenso, com o barco balançando bastante, mas os dias seguintes foram tranquilos. Chegamos no ASPSP no domingo de Páscoa (24 de abril), rendemos a equipe que já estava pronta para ir embora e ficamos como “zeladores” desse pequeno pedaço de terra brasileira tão longe do Brasil.

O ASPSP fica a 1010 Km da cidade de Natal (0°55’N - 29°21W), no meio do Oceano Atlântico. Encontra-se completamente isolado de ambientes rasos, pois fica numa região do Atlântico em que o fundo encontra-se entre 2000 e 4000 m de profundidade. O Arquipélago tem apenas 400 m de extensão e altitude máxima de 18 m, sendo considerado um dos menores conjuntos de ilhas isoladas do mundo. O relevo nessa região é bastante íngreme, sendo que somente a região conhecida como “Enseada”, além de outra a leste do Arquipélago, apresentam uma topografia mais horizontal. O ASPSP é uma Área de Proteção Ambiental (APA), onde grupos de quatro pesquisadores se revezam a cada 15 dias para mantê-la habitada e, dessa forma, garantir a soberania nacional em um raio de 200 milhas náuticas ao redor dessa região (O recém lançado livro de Fernando Moraes – Esponjas das Ilhas Oceânicas Brasileiras, Museu Nacional Série Livros – faz uma descrição completa da região).

A estação científica foi projetada por arquitetos que trabalharam junto à CIRM (Comissão Interministerial para os Recursos do Mar) e é cercada por ninhos de atobás – aves muito territorialistas, que são as verdadeiras donas e a diversão da ilha. Os pescadores do Transmar I ficam sempre próximos ao arquipélago para dar todo o apoio necessário. Mariana e Polyana, que trabalham com pesca, iam diariamente ao barco para coletar dados dos peixes obtidos por esses bravos homens do mar. Eu e Leandro, por outro lado, estávamos em busca de invertebrados bentônicos e precisávamos mergulhar. Por ordens superiores, ficamos restritos a mergulhar somente na Enseada, com uma profundidade entre 3 – 18 m. A Enseada é um lugar lindíssimo, com águas transparentes e pedras recobertas por vida, principalmente esponjas e algas verdes. A Enseada é o lugar mais abrigado do ASPSP, mas as condições de mergulho às vezes mudavam de uma hora para a outra. Mesmo sendo a área mais abrigada, não conseguimos fazer muitos mergulhos devido às condições do mar, que esteve sempre muito agitado. Porém, nos seis mergulhos que fizemos, coletamos esponjas da classe Calcarea, além de outros invertebrados. Essa classe ainda não havia sido bem investigada no ASPSP. A princípio, não encontramos nenhuma espécie que possa ser considerada invasora nessa região e também não encontramos a espécie Clathrina aurea (amarela), que procurávamos para os estudos de genética de populações que estão sendo realizados no Laboratório de Biologia de Porifera (UFRJ). Por outro lado, uma das esponjas calcareas mais abundantes do arquipélago foi uma Clathrina branca (foto 17) muito semelhante às espécies do “complexo Clathrina cerebrum” (composto pelas espécies C. cerebrum, C. brasiliensis e C. aspina). No momento, a equipe do laboratório está realizando análises morfológicas e moleculares para estabelecer a identificação dessa espécie e sua relação de parentesco com as demais espécies do complexo C. cerebrum encontradas na costa brasileira. A fauna de esponjas do ASPSP é realmente fascinante, principalmente porque muitos dos indivíduos encontrados são provavelmente espécies ainda desconhecidas da ciência. Essa fauna merece atenção não só de nós, pesquisadores, mas também do público em geral, pois é um patrimônio brasileiro.

Após 15 dias no ASPSP, embarcamos no Transmar I para voltar para o continente. No entanto, antes fizemos uma pequena parada em Fernando de Noronha, onde nos despedimos dos queridos pescadores do Transmar e nos dirigimos para uma casa da Marinha localizada na Ilha. Noronha é realmente um lugar paradisíaco, com suas águas transparentes e a mata verde. Durante essa expedição, todavia, não conseguimos coletar muitas esponjas, pois não havíamos conseguido ainda a licença de coleta para todas as regiões da ilha. Felizmente, na expedição seguinte, diversos espécimes de esponjas (incluindo Clathrinas amarelas) foram coletadas por Fernanda Azevedo. Mas essa história eu vou deixar para ela contar...

Texto: Emilio Lanna

A entrada da Estação Científica do Arquipélago São Pedro e São Paulo.

O segundo morfotipo de Clathrina apresentava os tubos frouxamente anastomosados e os ósculos abriam-se no topo da confluência de alguns deles. Esse espécime media cerca de 1 cm.

O Transmar I se preparava para mais uma noite de pesca, enquanto curtíamos o belo pôr-do-sol no farol.

Um dos espécimes associados ao “complexo cerebrum” de Clathrina. Note os tubos coletores localizados na superfície desse espécime, que media aproximadamente 8 cm.

Esse morfotipo de Clathrina apresentava tubos coletores que se abriam em ósculos amplos. Ele media cerca de 5-8 cm.

Na tarde do dia seguinte a nossa chegada, depois de arrumar a Estação fizemos o nosso mergulho de reconhecimento na Enseada. Com a água mais transparente que eu já vi, eu e Polyana (mais ao fundo) mergulhamos em apnéia, enquanto o Leandro nos fotografava.

Apesar de poucos, os mergulhos no ASPSP foram sensacionais. A água foi sempre muito transparente, como podemos ver nessa foto do mergulhado Emilio, tirada pelo Leandro.

Assim como em outras regiões do Brasil e do mundo, as esponjas no ASPSP competem por todo e qualquer espaço, como podemos ver nessa foto de uma pedra virada no fundo da Enseada, onde podemos ver três espécies de esponja: S. ruetzleri (direita inferior e centro-esquerda), Chondrosia sp. (direita superior) e esponja incrustante amarela não identificada (centro superior).

Outro morfotipo de Clathrina. Note a abundância de ósculos nesse espécime, que não foi observado em outros indivíduos. Esse espécime media cerca de 3 cm.